Apenas duas semanas depois dos dramáticos incêndios na Califórnia, cujos prejuízos bilionários ainda sendo contabilizados, poucas horas depois de assumir o governo, o presidente Donald Trump, desconsiderando a realidade escancarada das tragédias climáticas que estão ocorrendo em todo o mundo e contrariando o que têm sido afirmado por milhares de cientistas, disse em alto e bom tom que “as mudanças climáticas são uma farsa” e decretou uma série de medidas que, sem dúvida, irão contribuir para ampliar mais ainda a crise climática.
Retirou novamente os EUA do Acordo de Paris, importante tratado assinado por 196 países em 2015 com o objetivo de reduzir as emissões de gases que causam o efeito estufa para evitar o aumento da temperatura global acima dos 1,5ºC, considerada limite para evitar tragédias climáticas ainda mais graves. Mais, anunciou uma série medidas para reverter políticas de proteção ambiental promulgadas pelo ex-presidente Joe Biden e para aumentar a produção de petróleo e gás. “Vamos perfurar, baby, perfurar", apregoou.
O resultado será a escalada de inundações, furacões, grandes incêndios, secas rigorosas e ondas de calor, com o aumento vertiginoso de suas intensidade e frequência e de suas dramáticas consequências para a vida humana, a sociedade, o meio ambiente e a economia. Em outras palavras, medidas que contribuem para “apressar o fim do mundo”, pelo menos esse mundo como conhecemos hoje.
Mas diante de uma crise tão evidente, visível aos olhos de todos e sentidas na pele por milhões de pessoas em todo o mundo, por que a insistência na negação e em continuar alimentando suas causas?
O que se percebe claramente é que, conforme tem sido visto nessas primeiras semanas de governo, o presidente e o grupo que o cerca não aceitam qualquer tipo de limite ou restrição; se colocam acima das leis e se consideram imunes a quaisquer consequências, até mesmo em relação às leis da natureza.
Mas a natureza tem suas próprias leis e vai continuar seu curso, reagindo às ações humanas. Os eventos extremos climáticos, com suas trágicas consequências têm mostrado a necessidade do respeito aos limites naturais, nos lembrando todos os dias que somos parte desse sistema, que não estamos acima dele. E que, enquanto nossas ações não refletirem esse entendimento, eventos extremos continuarão acontecendo e em escala cada vez maior e atingirão a todos; mesmo que de maneira desigual ricos e pobres, contribuindo para ampliar as disparidades entre países, regiões e grupos sociais.
Intensificando ainda mais a injustiça climática global, já que os países e populações de baixa renda, que contribuíram muito menos com suas causas, são justamente os que enfrentam os impactos mais severos. Os números são reveladores: estudos realizados pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUD), mostram que o 1% mais rico da população mundial emite 76 toneladas anuais por pessoa, enquanto a metade mais pobre emite apenas 0,7 toneladas e que esse mesmo 1% é responsável por mais do dobro das emissões globais de CO₂, do que os 50% mais pobres.
A situação é preocupante; pois, pelo que tem sido mostrado todos os dias nos meios de comunicação e segundo as perspectivas dos cientistas do clima, decisões como as do atual governo norte americano, colocam mais ‘lenha na fogueira” do aumento de temperatura da Terra e contribuem para agravar ainda mais a crise climática já instalada.
Mas na realidade, se constituem apenas em parte dos problemas que têm origem no nosso modo de vida – baseado na queima exacerbada de petróleo e na utilização descontrolada de recursos aturais; bem como na baixa percepção de suas consequências. Por isso mesmo, as respostas até então dadas, tanto pelas nações, quanto pela sociedade de uma forma geral, estão muito aquém, mas muito aquém do necessário para enfrentar, reverter ou, pelo menos, estabilizar as crises ambiental e climática em curso.
Nesse sentido é urgente a redução drástica do uso de combustíveis fósseis e a aceleração da transição para energias renováveis (solar, eólica, geotérmica ou hidrogênio verde); exatamente o contrário das medidas anunciadas pelo presidente Trump. Mas também é urgente reduzir o desmatamento e reflorestar áreas degradadas; ao mesmo tempo ampliar o financiamento global, prometido
pelos países ricos e até agora não realizado, para apoiar os países mais pobres e as populações mais vulneráveis.
Em resumo, a crise climática exige ações imediatas e ambiciosas em nível global. Governos, empresas e a sociedade precisam agir juntos para reduzir emissões, proteger ecossistemas, garantir justiça climática e adaptar-se a um mundo em rápida transformação. Medidas essas que se desdobram em muitas outras e que se constituem num desafio inadiável para todos os países, mais ainda para a sociedade norte americana; pois, além dos EUA serem historicamente os maiores emissores de gases de efeito estufa, é responsável pela eleição desse governo.
É uma realidade dura, mas diante do negacionismo e da letargia dos que têm o poder de decisão, que impedem as mudanças na velocidade e profundidade necessárias, tudo indica que apenas a intensificação das tragédias será capaz de despertar a humanidade para os riscos de uma catástrofe global. É urgente que sejam tomadas medidas efetivas para “adiar o fim do mundo” - e isso só será possível se houver um choque de consciência antes que seja tarde demais.
*Sérgio Guimarães é fundador e ex- Coordenador Executivo e ex-Presidente da ONG ambiental ICV - Instituto Centro de Vida.
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