A escritora brasileira Nélida Cuíñas Piñón nasceu no Rio de Janeiro, em 03 de maio de 1.934, fazendo a passagem no dia 17 de dezembro de 2.022, em Lisboa. Jornalista por formação, foi editora e membra de conselhos editoriais de várias revistas no Brasil e exterior.
Desde muito jovem, aos 9 anos, a escritora costumava frequentar o Teatro Municipal, já destacando o amor pelas artes. No ano seguinte, aos 10 anos, convenceu um comerciante a lhe vender uma máquina de escrever, o informando que o seu pai o pagaria em breve.
A contista teve grande prazer em narrar histórias que conservou durante a vida. Contou ter sido criada com liberdade de escolha, e que sempre valorizou as coisas simples da vida, tal como os afazeres e cuidados com a casa e com os seus. Teve incentivo do pai e da mãe para a leitura e a escrita, tendo rememorado que o pai deixara aberta uma conta na Livraria Freitas Bastos, onde ela livremente escolhia e adquiria as obras a serem por ela consumidas. Dizia que os livros transitavam em sua imaginação, e que costumava repartir o tempo em torno do poder da arte, da literatura, da vida familiar, e da atração pelo amor. A sua escrita rodopiava a imaginação, que a projetava para o passado e futuro. Segundo ela: “Se a imaginação edifica enredos de amor, o corpo fatalmente sofre seus efeitos.”
Da mãe, Nélida “herdou” o gosto pelo teatro. Inclusive, certa vez, uma amiga da genitora a advertiu com a crítica de que não seria bom levar a filha a contemplar nus artísticos das esculturas em museus, nem mesmo das peças teatrais. A resposta foi a de que a sua filha deveria olhar o mundo sem preconceitos. Com o precioso incentivo caseiro, Nélida passou a praticar a escrita, sempre embalada por Mozart, Beethoven, Wagner e Verdi. Disse: “O ser humano é um peregrino. É só na aparência que ele tem uma geografia”.
Dentre as dezenas de livros da autora, “Uma Furtiva Lágrima”, escrito em 2015 e publicado em 2019, Nélida conta que recebeu o diagnóstico equivocado de um câncer agressivo, que lhe oportunizava poucos meses de vida. Assim, a escrita traduz um diário reflexivo sobre o passado e a mortalidade. É da escritora: “Ao mesmo tempo é bom saber que estamos sós no mundo, não nascemos de uma ninhada”.
Verbalizou que se constituiu em uma feminista histórica, por ter muito cedo aderido ao movimento. Recordou que foi na convocatória da ABI que verbalizou sobre a importância do primeiro 8 de março no Brasil. Proferiu ter aprendido com grandes personalidades femininas que conheceu, sendo esse entendimento primordial para a consciência humana.
Certamente, com o viés feminista, a contista entendeu a importância da autoetnografia para as mulheres, ao valorizarem e contarem as suas histórias, inclusive, se assim preferirem, em primeira pessoa. Destacou: “Falar em primeira pessoa requer audácia. Mas é uma opção natural. Enquanto falo por mim, ou penso por mim, incorporo os demais à minha genealogia. Não ando sozinha pelo mundo.”
Disseminou o seu conhecimento no período pandêmico, vivenciado há pouco tempo no mundo, afirmando que a literatura foi a sua melhor morada em tempos de distanciamento social. Asseverou que as redes sociais não a preenchiam por estarem se perfazendo em enfadonhas e monótonas. Vociferou: “Sinto que, cada vez mais, compartilhamos solidão”.
Nélida é inspiração e orgulho para as mulheres! Foi a primeira mulher a presidir a Academia Brasileira de Letras, sendo uma das escritoras mais lidas e traduzidas internacionalmente. Afirmou que todos os dias alguém bate simbolicamente à porta de uma mulher a incitando a desistir, sendo o seu dever diário a rejeição. Quanto à violência doméstica e familiar contra as mulheres, a escritora e jornalista foi precisa: “Quando os direitos humanos são desrespeitados em casa, tornam-se públicos.”
*Rosana de Barros é defensora pública estadual e mestra em Sociologia pela UFMT.
O Alô Chapada não se responsabiliza pelas opiniões emitidas neste espaço, que é de livre manifestação
Entre no grupo do Alô Chapada no WhatsApp e receba notícias em tempo real