Personagens centrais de um suposto plano de golpe de Estado, o ex-presidente Jair Bolsonaro e o general Walter Braga Netto se manifestaram, ontem, contra a Operação da Polícia Federal — que desarticulou o grupo envolvido no plano criminoso. O ex-chefe do Planalto chamou o inquérito de "chifre em cabeça de cavalo" e afirmou que as prisões de militares, os chamados "kids pretos", foram injustas.
A declaração de Bolsonaro foi dada durante uma transmissão ao vivo no perfil do ex-ministro do Turismo de seu governo, Gilson Machado. Ele ironizou o inquérito e atacou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator da ação na Corte.
"Uma coisa absurda essa história do golpe. Vai dar golpe com um general da reserva e quatro oficiais superiores? Pelo amor de Deus. Quem estava coordenando isso? Cadê a tropa? Cadê as Forças Armadas? Não fique botando chifre em cabeça de cavalo", afirmou.
As investigações da Polícia Federal apontam que foi montada uma organização criminosa que se utilizou de elevado nível de conhecimento técnico-militar para planejar, coordenar e executar ações ilícitas nos meses de novembro e dezembro de 2022. Eles cogitaram assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva envenenado.
O plano homicida também previa a morte do vice-presidente Geraldo Alckmin, além do sequestro e assassinato de Alexandre de Moraes. O grupo era formado por militares do Exército, da ativa e da reserva, além de um agente da PF, e foi batizado pelos golpistas de "punhal verde e amarelo".
Na semana passada, foram presos o general da reserva Mário Fernandes, e os tenentes-coronéis Hélio Ferreira Lima, Rafael Martins de Oliveira, Rodrigo Bezerra de Azevedo, integrantes dos kids pretos. O policial federal Wladimir Matos Soares também foi detido.
A operação foi embasada nos arquivos que foram deletados do computador do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid e também do general Mário Fernandes, ex-assessor do ex-presidente. A PF conseguiu recuperar as mensagens com teor golpista e o plano de assassinato nesses arquivos.
Jair Bolsonaro e outras 36 pessoas, a maioria militares, foram indiciados pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de direito e organização criminosa. Na live, o ex-presidente criticou a prisão dos quatro militares envolvidos na trama.
"Golpe agora não se dá mais com tanque; agora, se dá com táxi. E parece que o sequestro não saiu porque não tinha táxi na hora. É uma piada essa PF do Alexandre de Moraes", disse Bolsonaro, que está em São Miguel dos Milagres (AL) a convite do ex-ministro, e andou pelas ruas da cidade ontem. "Esses que estão sendo presos injustamente agora, de forma preventiva (...). Não encontra um só respaldo da lei que fala da preventiva para prender esses quatro oficiais", completou.
Braga Netto, que foi vice na chapa bolsonarista de 2022, comentou o caso por meio das redes sociais. Ele rechaçou a acusação de querer retomar o comando do país após a derrota nas eleições presidenciais e disse que "nunca se tratou de golpe e muito menos de plano de assassinar alguém". O pronunciamento foi acompanhado de uma nota de seus advogados.
O texto repudia o que chamou de "criação de uma tese fantasiosa e absurda em parte da imprensa de que haveria um golpe dentro do golpe". A menção se deve à possibilidade levantada de que Braga Netto poderia tentar atuar para também derrubar Bolsonaro do poder e assumir a Presidência posteriormente.
A defesa afirma que, ao longo de sua trajetória, o ex-ministro "sempre primou pela correção ética e moral na busca de soluções legais e constitucionais". Os advogados citaram "lealdade" por parte do general.
"Durante o governo passado (Braga Netto) foi um dos poucos, entre civis e militares, que manteve a lealdade ao presidente Bolsonaro até o final do governo, em dezembro de 2022 e a mantém até os dias atuais, por crença nos mesmos valores e princípios inegociáveis", diz.
Suspensão de salário
O subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Furtado, solicitou a suspensão do pagamento do salário do ex-presidente Jair Bolsonaro (capitão reformado), que recebe R$ 12,3 mil.
Na representação, são citados outros 24 militares ativos e da reserva do Exército que foram indiciados pela Polícia Federal (PF) por participação em uma tentativa de golpe de Estado. Entre eles, os generais da reserva Augusto Heleno e Braga Netto, cujos salários, respectivamente, são de R$ 36,5 mil e R$ 35,2 mil. Além do tenente-coronel Mauro Cid (R$ 27 mil).
O subprocurador destacou que os salários dos militares totalizam anualmente R$ 8,8 milhões. "A se permitir essa situação — a continuidade do pagamento da remuneração a esses indivíduos — o Estado está despendendo recursos públicos com a remuneração de agentes que tramaram a destruição desse próprio Estado para instaurar uma ditadura", afirmou Furtado.
O representante do MP solicitou também bloqueio de bens no valor de R$ 56 milhões de todos os 37 indiciados pela PF, além do compartilhamento do inquérito, que está sob segredo de justiça, com o TCU.
"Por haver esse evidente desdobramento causal entre a trama golpista engendrada pelos 37 indiciados e os prejuízos aos cofres públicos decorrentes dos atos de destruição do patrimônio público em 8 de janeiro de 2023, que montam em R$ 56 milhões, considero que a medida cautelar também deve abranger a indisponibilidade de bens", escreveu o subprocurador.
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