A regulamentação dos cigarros eletrônicos, o seu uso como ferramenta de redução de riscos em relação ao cigarro tradicional e formas de combater o crescente mercado ilegal estão em discussão no Brasil. A fabricação, importação e a comercialização dos chamados vapes são proibidos no Brasil desde 2009, por determinação da Anvisa.
No entanto, uma série de estudos científicos independentes, produzidos por centros de pesquisa e órgãos de saúde internacionais, apresentam evidências de que vaporizadores são capazes de reduzir em até 95% as substâncias potencialmente tóxicas emitidas no consumo do cigarro convencional. Isso significa que esses dispositivos podem ajudar a reduzir os riscos à saúde dos adultos fumantes.
Com base nesses argumentos, entidades, associações de consumidores e a indústria defendem a regulamentação dessa alternativa no país, que hoje vê o mercado ilegal crescer significativamente, com produtos que podem ser facilmente acessados, à venda em lojas físicas, online e até aplicativos de entrega.
Segundo pesquisa realizada pelo Ipec em 2022, já são 2,2 milhões de consumidores adultos de cigarros eletrônicos e cerca de 6 milhões que experimentaram o produto no ano passado, um produto ilegal no país. Hoje, questões como a falta do controle de qualidade e incertezas sobre a procedência desses dispositivos comprometem a potencial redução de riscos, já que 100% dos dispositivos que chegam ao nosso país são contrabandeados.
“Apesar de proibidos, os cigarros eletrônicos são facilmente encontrados, o que mostra que essa medida de proibição não funciona. Por isso, defendemos a ideia da regulamentação e criação de regras para produção, assim poderá se controlar quais as substâncias poderão estar presentes na composição e as quantidades delas”, argumenta Lauro Anhezini Junior, Chefe de Assuntos Científicos e Regulatórios da BAT Brasil.
Evidências científicas
É preciso destacar que os cigarros eletrônicos não são inócuos, mas as experiências internacionais comprovam que, quando devidamente regulamentados, os dispositivos são eficazes como alternativas para redução de danos entre a população adulta que já é fumante.
O relatório mais recente e independente, com mais de 400 artigos revisados, publicado em setembro de 2022 pelo Ministério da Saúde do Reino Unido, demonstra que o vaporizador é até 95% menos prejudicial do que o cigarro tradicional, ou 20 vezes menos nocivo. A revisão Cochrane, divulgada em novembro de 2022, é outro exemplo de referência no conceito de redução de danos.
Cerca de 80 países, como EUA, Inglaterra, os 27 membros da União Europeia, Canadá e Nova Zelândia, já regulamentaram a comercialização do produto, com base nesses estudos científicos que comprovam a redução nos riscos à saúde em relação ao cigarro convencional.
A Suécia apresenta uma estratégia bem-sucedida, uma vez que está próxima de alcançar o marco histórico de se tornar o primeiro país ‘livre do tabagismo’ da Europa, chegando a uma taxa abaixo de 5% em termos de prevalência de fumantes nos próximos meses. E os benefícios da estratégia são visíveis, com o país tendo a menor porcentagem de doenças tabaco-relacionadas na União Europeia e uma redução de 41% nos casos de câncer relacionados ao uso de produtos de tabaco.
Recentemente, o Ministério da Saúde da Inglaterra lançou o programa “Swap to Stop” (Trocar para Parar), que prevê a distribuição de 1 milhão de kits de cigarros eletrônicos para adultos fumantes que tenham como objetivo diminuir ou parar de fumar.
“O Brasil seguirá a tendência verificada em diversos outros países, ao considerar que há alternativas aos cigarros convencionais, e temos grandes expectativas de que a Anvisa tomará sua decisão à luz das melhores evidências científicas, considerando todos os aspectos e preocupações envolvidas”, comenta Anhezini.
A regulamentação no Brasil
No último dia 30, foi aprovada na Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal a realização de audiência pública sobre cigarros eletrônicos, por meio de requerimento protocolado pela Senadora Soraya Thronicke (Podemos – MS).
O pano de fundo é o debate sobre a regulamentação deste mercado no Brasil e o risco ocasionado pela falta de regulação e de controle com base em regras sanitárias, já que a proibição não está funcionando como deveria.
De acordo com Alessandra Bastos, farmacêutica e ex-diretora da Anvisa, a proibição se deu porque, em 2009, não existiam subsídios suficientes. No entanto, em todos esses anos, robustas evidências científicas foram divulgadas e foram base para a regulamentação ao redor do mundo. “A experiência internacional mostra que regras de produção, acesso e monitoramento possibilitam o controle. Hoje, a proibição é ineficaz. Por que não oferecer uma opção menos danosa? É como a rotulagem de alimentos. Você não proíbe as pessoas de comerem, mas alerta sobre a quantidade de açúcar ou sal. Isso é redução de risco!”, explica.
A data para a realização da audiência pública será definida no início de setembro. Atualmente o processo de regulamentação está sob responsabilidade da Anvisa que, após a movimentação do Senado, deverá dar continuidade ao assunto, estabelecendo prazo para que atores sociais e econômicos envolvidos na discussão enviem suas manifestações e contribuições à agência.
A decisão sobre a regulamentação no Brasil está prevista para ocorrer ainda este ano.
Nota:
- Vaporizadores e produtos de tabaco aquecido são produtos destinados a maiores de 18 anos, assim como o cigarro. Estes produtos não são isentos de riscos.
- A redução de riscos de vaporizadores e produtos de tabaco aquecido é baseada nas evidências científicas mais recentes disponíveis e desde que haja a substituição completa do consumo de cigarros tradicionais.
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